sábado, 21 de fevereiro de 2009

Simplesmente Maria

Hoje vou falar de Helène, aliás de Maria Helène. Maria Helène é uma luso-belga, fruto do casamento de um português, funcionário público com forte ligação ao comércio externo e de uma belga. Cedo, Maria Helène se acostumou a viajar dada a profissão do seu pai. Não é estranho que venhamos a encontrar Helène em Londres, secretária numa importantíssima firma do meio financeiro britânico. Formada superiormente em secretariado, falando fluentemente várias línguas, eficiente e bonita não lhe foi difícil subir, tanto profissional como socialmente. Más língua atribuíam-lhe esse sucesso aos atributos físicos. O narrador não tem por missão apagar rumores que se propagam nos bastidores do enredo.

Richard conheceu Maria Helène nos seus, deles, verdes anos. Embora em áreas diferentes e por métodos diferentes, cá está de novo o narrador a dar crédito aos boatos, ambos foram tendo sucessos paralelos. O pai de Maria, por deveres sociais aliados à sua costela de alentejano era um habitué das caçadas aos alces e das batidas às raposas. Richard estava no meio. A aproximação a Helène, foi também aqui por duas vias, muito gosta o narrador de juntar o útil ao agradável, muito facilitada. Richard e Helène chegaram a ficar noivos.

Não sei se terei paciência para voltar ao tema Richard-Helène quando se avizinham cenas muito mais empolgantes. Talvez Maria Helène tenha sido usada, por quem tem a missão de escrever, para encher chouriços, talvez não. A verdade é que, apesar do corte de relações, Maria Helène nunca abandonou Pêpê. Foi uma promessa que fez a si própria no dia em que a mãe do garoto morreu de parto. Hoje Pêpê tem 22 anos e sempre viveu com Helène. E Richard sempre pagou tudo, até ao último tostão.

terça-feira, 17 de fevereiro de 2009

Exposição (i)

Olhou para o quadro, e por ali parou o tempo em minutos ou horas, que a levaram a percorrer todo o espaço, imenso e colorido. E a tela pintada em vermelho escuro o suficiente para que entre as texturas se pudessem observar os brilhos do sangue. E então, bem no centro daquele rectângulo escarlate, estava um furo. Um pequeno buraco com a forma de uma bala.
Margarida pensou em perfeição. E segundo todos os padrões de perfeição aquele quadro estava longe disso. Mas o que era a perfeição? O que era aquele sentimento de que nem tudo é bom ou bonito, nem tudo está certo mas ao qual a perfeição é inerente.
Ao fundo, naquela sala repleta de pinturas, numa miscelânea de expressão artística de exaltação às armas de fogo, vislumbrou um homem. Alto, moreno de olhos verdes. Interrompendo aquela dupla fixação veio a artista que a convidou para o workshop mostrando-se espantada e até um pouco embaraçada com a sua presença em tão selectivo meio.
Margarida perguntou quem era o homem que a olhava, numa tentativa de levar ao engano as suas fixações. E na resposta peremptória obteve um simples, cuidado, não é artista nem conhecedor, é rico e apreciador, tem bom gosto mas é selectivo, e ninguém sabe muito sobre ele. O seu nome é Richard.

domingo, 8 de fevereiro de 2009

Intriga, mistério, suspense

Ainda pensava no telefonema de Richard. A sua voz era de comando. Nunca ele tinha descurado nenhuma informação, nunca se negou a uma solicitação. Nem Pêpê sabia porquê, no entanto, a verdade é que Richard sempre o tinha visitado desde o jardim-de-infância ao colégio. E tanto quanto sabia, era Richard quem lhe pagava os estudos superiores. Helène, a quem ele carinhosamente chamava mamã, apesar de saber que a sua mãe tinha morrido no parto, pouco lhe falava de Richard e desviava todas as conversas em que ele o mencionava, mas tinha sido por ela que sabia dos pagamentos da universidade. Naquele dia, Richard ligou-lhe e pouco mais terá dito que, Pepê, toma atenção a Andrea. Intrigou-o, mas não teve coragem de lhe perguntar porquê. A aura de Richard não o permitia questioná-lo. Não, não era uma minudência, efectivamente. Mas como é que Richard sabia do seu conhecimento com Andrea?

Andrea, apenas estava à espera do toque da campainha para sair com Pêpê. O cheiro da chuva lá fora e a vontade de ter uma companhia para beber um puro malte conjugavam-se para uma noite agradável. Talvez se embriagasse, talvez não. Teria de contactar Margarida, mas não sabia ainda como o fazer. E apesar de Pêpê ser um grande amigo ainda o considerava imaturo para se abrir com ele. Ah se tivesse ido jantar com Ruben… Não! Pensou em voz alta. Pêpê era a companhia ideal para a ajudar a afogar esta angústia.

E desta vez é justo que se diga que o narrador não introduziu àpartes que, apesar de embrulharem a história, proporcionam complicados exercícios de compreensão aos seus leitores. Hoje, se repararam bem, nem Andrea pensou em espanhol.

terça-feira, 3 de fevereiro de 2009

Loucura

Enquanto Richard lhe acariciava os cabelos, Margarida lembrava-se de Londres, nostálgica e em tons de cinzento. Criava também as imagens da sua Londres de ruídos e odores e esconderijos multicolores. Era esta a cidade na qual passou um mês de loucura. Loucura contínua que a acompanha a cada avião, a cada fugida da realidade.
Mas é a sua alma a chamar por si - pensou.
E na noite perdida perto do Barbican Center no coração de Londres, pelo qual havia passado vezes sem conta para ver exposições de arte, mas que à força do aço e do vidro das luzes sem identidade e das ruas esquecidas se tornam numa descoberta a cada vez. E naquela noite levaram-na num desespero a dirigir-se à primeira pessoa que viu. Àquela hora sabia que não deveria estar sozinha.
Margarida é noctívaga, e aventura-se frequentemente pelas noites das cidades que visita, como num sonho, como uma esponja que absorve. Cada porta entreaberta, cada sombra que espreita através de um armazém abandonado são convites à sua loucura. A loucura que a levou à festa em que conheceria Richard.
Deu-lhe um beijo e adormeceu.